"Dei o primeiro beijo no Lira, quando tinha 25 anos. Ele, 36.
Eu estava de mudança marcada para Brasília, onde cursaria o mestrado em Ciência Política na UnB.Viajei dias depois. Despachei carro e livros e me fixei num apartamento, na Asa Norte.
Chorava de saudades ao acordar, ao longo do dia, antes de dormir. Numa noite, para me distrair, fui ver Buena Vista Social Club, num cinema qualquer. Chorei do começo ao fim.
Até hoje, quando escuto aquelas músicas, sinto uma tristeza danada.
Não quis esperar o tempo curar a saudade, como me recomendaram. Mandei carro e livros de volta para Fortaleza. Abandonei mestrado, voltei para meu antigo trabalho e implorei ao Lira para que me aceitasse como sua namorada.
Ele resistiu muito, até que um dia disse sim.
Então nunca mais nos aquietamos. Fomos morar em Salvador, em São Paulo, no Porto, depois em São Paulo de novo.
Juntos, escrevemos incontáveis laudas, descobrimos livros, filmes, músicas, comidas, bebidas, gostos.
Mas quase tudo foi ele quem me apresentou. O Lira me ensinou tudo o que sei sobre quase tudo.
Pegamos simpatia e birra por pessoas, palavras, gestos. Criamos nosso repertório de gostos pessoais e idiossincrasias. Enfrentamos as barras mais pesadas, mas vivemos as maiores felicidades desse mundo – acima de todas, o nascimento das nossas meninas, Emília e Alice.
Passados 25 anos, desde aquele primeiro beijo, deixamos de ser um casal. A vida tem dessas coisas. Sigo nessa existência, certamente melhor do que já fui um dia – e, se assim o é, é muito graças ao que vi, vivi e aprendi com o Lira."
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