Dados
apresentados há quase um ano, na revista Carta Capital, contabilizados pela
Comissão Pastoral da Terra, apontam 1.614 pessoas assassinadas nos últimos 25
anos (agora são mais, porque os dados ainda estão sendo atualizados) no Brasil
em conflitos de terra. Sendo que a impunidade é aterradora... apenas 91 casos
foram a Juízo.
No
mês de abril completou dois anos da morte de Zé Maria de Tomé, liderança
comunitária da Chapada do Apodi. A Chapada do Apodi vivencia o abuso de
agrotóxicos, com a conivência do poder público local. As comunidades se
organizam para combater esse desrespeito com o povo e a natureza, sofrendo com
a alta contaminação das águas e afetação do equilíbrio ambiental, e recebem
como presente as represálias.
Enquanto
isso, os agrotóxicos são isentos de
impostos. Veja só o tipo de coisa que a gente encontra: veneno sendo isento
de impostos! É ainda mais alarmante: além dessa indústria da morte ser livre de
taxas, o que enriquece os fabricantes de venenos (como a gingante Monsanto) e
incentiva o uso, a fiscalização quanto à maneira como os agrotóxicos são
aplicados é absurdamente frouxa. Basta chegar, sem recomendação técnica alguma,
numa loja destas do interior e comprar qualquer veneno, para matar, por
exemplo, as ervas do quintal (onde as crianças brincam), sem proteção individual
qualquer, que facilmente se leva para casa.
Essa
realidade dos venenos não é algo restrito à Chapada do Apodi. Notemos como se
tornou banal o herbicida ou “mata-mato”, como é vulgarmente chamado. É
interessante perceber como o povo se refere ao veneno: como remédio. Denota a
imagem que querem passar para os produtores que os agroquímicos só vêm para
ajudar. Os agricultores, simples e sem informação, e mesmo os sabichões que
confiam nos técnicos formados no modelo detonador da natureza, estão por aí
espalhados no nosso sertão e serras, “banhando-se” com essas atrocidades que o homem
cria.
Não
faz tanto tempo assim que os EUA impuseram para os países do “Terceiro Mundo” o
uso de venenos, alguns que nem eles mesmos tinham coragem de usar. O famoso DDT
(empregado na agricultura para não deixar cair a indústria de venenos criados
para a guerra) matava os pássaros das plantações (muitos pássaros morreram em
nossa região neste tempo); além de seus impactos ferozes na saúde dos camponeses,
prejudicava cruelmente o equilíbrio ambiental, foi denunciado pelo livro “Primavera
Silenciosa” de Rachel Carson, no qual explicava o poder destrutivo do uso de
agroquímicos. Essa denúncia do descompromisso do Capital com a preservação
ambiental e saúde da população estimulou todo um afloramento da militância
ambientalista no mundo, inclusive no Brasil, isso na década de sessenta.
Ainda
hoje persiste a utilização maciça e crescente de agrotóxicos, segundo a
desculpa de que os mesmos permitem cultivar de forma mais prática, rentável e
produtiva. Esta é a bandeira da Revolução Verde, que, falsamente, apresenta-se
nos nossos livros de geografia da escola como a solução para não ter havido uma
crise alimentar no mundo. Então, quer dizer que não há crise alimentar no
mundo? Isso quer dizer que o um bilhão de pessoas que padecem de fome não
existe?! Não existem para a indústria do veneno... Na realidade, essa é só mais ilusão que
querem empurrar por nossas goelas adentro. Há maneiras de se produzir, que não
na monocultura dependente de agroquímicos, baseadas nos mesmos princípios que
mantém a natureza perfeitamente equilibrada, e que são muito mais justos
socialmente. O problema é que as escondem da gente.
Ainda
se tem a ilusão que a grande produção de commodities
representa riqueza para o povo brasileiro. No entanto, o que é riqueza para
o povo brasileiro é o que a agricultura familiar pode produzir e já produz,
porque envolve direta e indiretamente muito mais mão de obra, e gera riqueza de
forma igualitária (sem patrões grandes) e com muito mais potencial de
sustentabilidade; imagine, então, se as técnicas empregadas na agricultura
familiar fossem ainda mais adequadas, agroecológicas!
Infelizmente,
a força conservadora dos ruralistas, eleitos até mesmo por muitos agricultores
familiares e demais gente simples, dão a série de privilégios absurdos para a
indústria do veneno e garante chances mais fáceis de enriquecimento para os
latifundiários, ao custo de injustiça na distribuição fundiária e econômica e
da destruição ambiental. O novo Código Florestal só vem corroborar com a
atrocidade que é o desrespeito da casa parlamentar com os interesses reais do
povo e da terra.
A
máquina capitalista atropela os pequenos. São os pequenos que cuidam,
enganados, dos agrotóxicos nas plantações. Os patrões comem é produtos
orgânicos! E os que criticarem e se posicionarem contra a opressão, correm o
risco de vida, pela força de “coronéis” covardes nos sertões por aí afora.
Enquanto nós corremos os riscos de vida, em cânceres subsequentes, pelo acúmulo
de substâncias danosas em nossos organismos.
Depois não adiantará tomar leite para
desintoxicar, segundo a receitinha da vovó.
(Benedito
Gomes Rodrigues)