domingo, 30 de dezembro de 2012

EDITORIAL DO DN DE HOJE. MERECE SER LIDO!

  Em decorrência da transição da cultura escrita para a cultura digital, acontece, na atualidade, aquela que é considerada a mais radical transformação na história da inteligência da Humanidade. Ao oferecer uma experiência visual e de manejo completamente diversa dos livros convencionais, a forma digital de ler causa, em paralelo, mudanças no conteúdo daquilo que é transcrito através da informática. Segundo estudiosos da história cultural através dos tempos, está sendo desenvolvida uma forma de relação com a palavra escrita, causadora de indiscutíveis impactos na mente humana.

  Em vários países, os livros digitais já são mais vendidos do que os impressos em papel. Só para citar um exemplo, o livro online "Cinquenta Tons de Cinza", de E.L. James, vendeu na Inglaterra mais de dois milhões de exemplares, em apenas quatro meses. Desde que foi criado o alfabeto, ocasionando modificação no entendimento das palavras e dos conceitos, o mundo não presenciava um impacto cognitivo de tamanho poder de cooptação e de tão abrangente relevância. Alguns pesquisadores chegam a assegurar que, em futuro próximo, a leitura solitária poderá vir a ser substituída por uma atividade comunitária eletronicamente interligada, que ganhou, desde já, a denominação de "leitura e escrita sociais". Contribui também, para a crescente popularidade da literatura digitalizada, o surgimento dos chamados "livros enriquecidos", que trazem desde trilha sonora a vídeos e fotografias, acionados automaticamente. A presente revolução vem caminhando tão além do inicialmente esperado que até os segredos pessoais da leitura, anteriormente restritos às mentes dos leitores, agora podem ser detectados pelas editoras, as quais sabem quantas páginas foram lidas, o tempo gasto pelos leitores e até seus títulos preferidos.

  Através dessa pesquisa, observa-se que livros de não ficção são lidos de modo intermitente e que leitores de novelas policiais consomem essas obras mais rapidamente do que os apreciadores de outros tipos de ficção literária. São dados que contribuem para levar ao conhecimento das editoras as reais preferências do público. Adeptos do "politicamente correto" já organizaram, nos Estados Unidos, um movimento de proteção à privacidade do leitor, com o objetivo de disciplinar até que ponto as editoras podem ir, em sua voracidade de obter dados para suprir-lhes exigências mercadológicas. Segundo os opositores da escrita online, esta teria efeitos maléficos na área cultural, representando "o próprio portal da ignorância" e verdadeira catástrofe para quem valoriza a clareza e a precisão de estilo, além de prejudicar o hábito tradicional das boas leituras.

  Os adeptos do mundo literário digital tenderiam a perder a habilidade de manter contato, ou tentar escrever, uma prosa coerente e bem estruturada. Na área da neurologia, investiga-se se a tendência à desatenção causada pela internet seria capaz de afetar a construção e preservação dos próprios circuitos neuronais. Apesar dos receios, já está claro que o cérebro possui mecanismos de compensação para tais perdas.

  Procede da década passada a preocupação com a qualidade da leitura, até pela falta de concentração causada pelos aparelhos eletrônicos. O maior temor é que o universo digital roube às pessoas a capacidade intelectual da leitura atenta e profunda, que o filósofo Walter Benjamim chamava de "silêncio exigente do livro", impossibilitado pelo caráter circunstancial dos meios digitalizados.

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