Bem vindos, médicos cubanos!
Plínio Bortolotti, no O Povo
"Desabou sobre o Ministério da Saúde uma enxurrada de críticas depois
do anúncio de que seriam contratados seis mil médicos cubanos para
trabalhar no Brasil. Tirante a palhaçada da revista Veja, vibrando em
suas páginas, a acusação de que o país seria inundado de 'espiões
comunistas' – parlapatice indigente, que merece citação apenas pela
teratologia circense – sobram os argumentos risíveis e os supostamente
técnicos.
Entre os risíveis está dizer que os cubanos teriam dificuldade de
entender a língua dos brasileiros. Pelo tipo de formação, os médicos da ilha terão menos dificuldade para compreender os males do povo do
interior do que a elite médica nativa, que conhece Miami, porém, nunca
esteve nos grotões. Um destes ficaria com cara de abestado frente a um
sertanejo queixando-se do pé desmentido ou de uma mãe aperreada, prestes
a ter um farnesim, dizendo: 'Doutor, trouxe o meu bichim porque ele
está com o bucho quebrado'.
Quanto aos argumentos 'técnicos', as corporações médicas – conselhos e
sindicatos – alegam faltar aos cubanos a preparação para o exercício da
medicina. Poder-se-ia dizer o mesmo de boa parte dos médicos nativos,
porém, dos cubanos será exigida prova de qualificação, o que descredencia
a crítica.
O suposto argumento técnico, na real, visa a garantir reserva de
mercado. Mas fica difícil entender, mesmo desse ponto de vista, pois a
maioria dos médicos tupiniquins recusa-se a clinicar em áreas remotas.
Assim, essa reserva assemelha-se às 'áreas de engorda' de especuladores
imobiliários, que seguram grandes lotes urbanos, esperando valorização.
Pelo jeito, do mesmo modo agem as corporações médicas. Querem, talvez,
criar uma reserva preventiva, pois, por ora, não se dispõem ao trabalho
distante.
Aceitem-se os motivos dos médicos brasileiros que preferem os grandes
centros. Mas eles não têm o direito de atrapalhar os profissionais
dispostos a mergulharem no Brasil profundo."
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