Yuri Firmeza
ESPECIAL PARA O POVO Ao
adentrarmos no McDonalds vemos, estampado em uma parede, o retrato de
um funcionário que se sobrelevou naquele mês. O destaque inscreve, mais
do que uma imagem, o rosto do vencedor. A meta foi alcançada, o herói
satisfez seu patrão e o lisonjeio o enche de orgulho. Este
procedimento, da promoção salarial por mérito, produz competitividade e
garante, de maneira perversa, que o bom funcionamento da empresa esteja
diretamente vinculado ao desejo de destaque de seus empregados. Ademais,
a rivalidade é o motor desenfreado nas relações com os outros e
consigo.
Tendo como base esta lógica empresarial,
predominante no capitalismo cognitivo, a edição 2013 do Salão de Abril
incita a competitividade através de uma ação marqueteira.
O
Salão, que retrocede a cada edição, tenta desta vez ressuscitar o seu
corpo agonizante através do prêmio de 70 mil reais conferido a um único
artista – o funcionário premiado. Este é o slogan publicitário do Salão
que tem como álibi a cristalizada assertiva de ser o mais antigo Salão
do País. Mais grave do que este equívoco histórico é a afirmação,
veiculada no site do Salão de Abril e reiterada por diversas vozes, de
que trata-se do “principal evento de artes plásticas do Ceará”. O
principal ou um dos poucos promovidos por uma Secretaria sucateada e
negligente?
No entanto, a frase é bem formulada pois a
operação é a mesma de um evento. Evento espetaculoso em total
disparidade e descaso com a produção dos artistas em Fortaleza. Evento
volátil que não cria pertencimento com a cidade – a não ser pela sua
mera reincidência apática ano após ano. Evento que não deixa lastros e
que para cumprir agenda precisa ser feito às pressas antes que o mês de
Abril definhe – pensemos no prazo diminuto que foi dado ao curador desta
edição do Salão de Abril, Ricardo Resende, para que apresentasse uma
curadoria tirada da cartola. Não é possível desenvolver pesquisa
curatorial com prazos exíguos que não permitem que o curador se debruce
sobre a produção da cidade. Do mesmo modo que não é possível que
curadores e artistas continuem aceitando estas condições descabidas de
trabalho. Em suma, evento que não agrega, mas tenta desastrosamente
maquiar a falta de políticas públicas que assola a cidade. Mas parte dos
empregados da arte já começam a tirar seus velhos projetos empoeirados,
esquecidos em seus baús, e almejam, agora, serem o funcionário do mês.
Não
haverá surpresa se este for o Salão mais concorrido em sua história. E
não haverá espanto se isto for massivamente veiculado como uma
conquista, pois é o mecanismo quantitativo, os números e os recordes que
pautam a pertinência destes eventos.
É preciso lembrar que
esta edição do Salão está ocorrendo majoritariamente com o patrocínio do
Banco do Nordeste e que sem esse patrocínio seria inviável a sua
realização. Nem a verba de 70 mil reais concentrados a um artista e nem
mesmo a realização do “principal evento...” estavam na rubrica da
prefeitura.
Enquanto isso, à revelia das políticas públicas
inexistentes na cidade (por mais paradoxal que seja esta frase),
artistas inauguram espaços e produzem pensamento a partir e com
Fortaleza, em total assimetria com o ranço colonialista alencarino (que
não é um mérito nosso, pois existe igualmente em cada cidade do Brasil,
em menor ou maior escala). Em Fortaleza, a Milu Vilela tem outros nomes,
mas a operação de poderio é semelhante.
O montante investido
neste antigo Salão – que mais do que antigo é velho, mofado e caduco em
seu formato e anseios – poderia facilmente ser investido em uma série
de ações que se desdobrariam ao longo do tempo. Ao invés de um evento
espetaculoso, pontual e passageiro, uma ação continuada, processual e
formativa.
Visivelmente a cultura está sendo tratada nos
moldes do mercado transnacional. O que esperar senão Big Macs, o rosto
do funcionário do mês e sua “obra de arte” escancarados nas páginas de
algum jornal?
O Salão moribundo não pode nem mesmo descansar
em paz, pois é através dele que uma tacanha rede de politiqueiros mantêm
seus rostos em visibilidade nos cargos que ocupam há tanto tempo quanto
a existência do Salão.
Mas atentem-se, de tão velhas as coisas apodrecem.
Yuri Firmeza é artista visual e professor do curso de Cinema e Audiovisual, da Universidade Federal do Ceará.
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