“França e Terror III
A França é um modelo de civilização com
dificuldades em encontrar uma crença coletiva e um fio condutor como no
passado. O símbolo disto é o filme ‘Intocáveis’ (Intouchables)
. Um francês rico e culto, mas tetraplégico, incapaz de se alimentar sozinho.
Um africano cheio de energia, mas incapaz de saber o que é um ovo Fabergé. O
africano é sinceridade e corpo; o francês é civilização e mente. O francês não
pode dispensar o corpo do africano e seu trabalho, mas tem dificuldade em
trabalhar a alteridade. Na visão otimista do filme, a junção dos dois é
benéfica para ambos. Ataques como o ocorrido ao Charlie Hebdo e este recente,
forçam a sociedade francesa a pensar seus valores. Sartre disse que a invenção
do judeu deve muito ao discurso antissemita. Provavelmente, a invenção do
radical é algo gestado na civilização do laicismo ocidental. O outro deve
ajudar a definir o eu. Sinal do esgotamento: franceses não fazem mais filhos.
Filhos são aposta no futuro e na crença de que sua sociedade deve viver. Abrir
mão dos filhos é parte deste processo. Como já foi dito, demograficamente o
futuro está nas mãos dos imigrantes. Como no poema de Kafávis, À Espera dos
Bárbaros, os ataques podem dizer para os franceses quem eles são, no que
acreditam, para onde desejam ir. A sociedade francesa não está conseguindo
fazer o que os EUA fizeram com milhões de imigrantes: tornar o ‘sonho americano’
parte do imaginário de todos. O custo de identidade a partir dos bárbaros é a
fila de cadáveres nas ruas de Paris porque, tragicamente, o fundamentalista
também está construindo sua identidade a partir da França.” LEANDRO KARNAL
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