domingo, 15 de maio de 2016

MEIO EU

  "ESTORIL, 1976.
  FUI BOÊMIO, precocemente. Bebia pouco, apenas para 'molhar a palavra' - como se dizia. Havia luar e violão. Havia uma causa a vencer. Palavras que deviam ser evitadas. E segredos. Mulheres, havia. Mulheres não muito recatadas, com um certo modo hoje muito natural de conversar com homens de igual para igual. Um jeito desconcertante de nos apaixonar. Eu amava as canções e as mulheres como duas rendições voluntárias: era bom, muito bom dizer 'sim' para mulheres inteligentes e cantar com elas os poemas da liberdade.
Mas um dia os trovadores se fizeram pais e pais precisam acordar cedo para trabalhar e as violas sumiram. Com eles, as mulheres, que lhes deram filhos, sumiram também.
 E, como eles, sumi eu por iguais motivos. Daí, não mais boemia amanheceu, enfim, e havia um País a construir (nada foi como a gente pensou que seria, mas alguma coisa começou a se mover)."
 Ricardo Alcântara, publicitário

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 Foto: Aurélio Alves/O Povo