22 de mai. de 2017

TEXTO LONGO...

...MAS MERECE SER LIDO!
"O gracioso e perigoso mundo dos seres apolíticos
Tudo é política e estejam certos, de que não há opinião, posição ou movimento que não seja político, que não se enquadre nesta ou naquela perspectiva ou concepção política. Onde está a política? Ora, está em tudo e em todos. Na igreja, na associação de bairros, nos sindicatos, escolas, universidades e na reunião dos condôminos. Está nos encontros dos amigos para um churrasquinho inocente e está no que assistimos na TV, ouvimos no rádio ou lemos no jornal. Está em nosso lazer, no trabalho semanal e na forma como nos relacionamos com tudo o que nos envolve, cerca e define.
Nunca é demais ou exagerado afirmar que a política está em tudo e está em todos; na parte, no fragmento, no todo e no tudo. O filosofo Antonio Gramsci (1891-1937) um dos fundadores do Partido Comunista Italiano (PCI) mais provocante ainda, arremata dizendo que 'tudo é partido'.
É que a política, não necessariamente expressa em formas partidárias, está, inclusive e por sinal, naquelas pessoas que vociferam que 'odeiam a política', que são 'apartidárias', como se tais declarações a isentassem do mundo de contradições e que define as próprias vidas e os rumos que tomam. É como se pensar de forma tão torpe tornasse o peso deste mundo eivado de políticas, mais leve e suave sobre os próprios ombros. É erro crasso e central. Fugir da política não confere qualquer tipo de proteção, ao contrário, vulnerabiliza, desprotege e fragiliza.
Saber o que se passa, das posições majoritárias e minoritárias; dos comportamentos das classes do capital, das iniciativas das classes populares; entender de táticas e estratégias; saber analisar uma conjuntura para compreender uma estrutura e sua atualização; saber se posicionar adequadamente... Isso sim, te resguarda de riscos, te vacina de decepções, fracassos e, sobretudo, de golpes. Saber, protege; ignorar é suicídio.
É espantoso porque são muitos os que se ufanam de certo 'apolitismo' como se tal peripécia fosse possível! Outros emendam, tal qual virgens incólumes com orgulho bisonho entre os caninos de serem 'apartidários'. A ciência e sua irmã siamesa, a 'técnica' são os mais diletos refúgios dos assim autodenominados 'apolíticos'.
Não é uma casualidade que políticos conservadores afirmam que suas equipes serão 'técnicas'. Técnicos não tem posição política? Não preferem o capitalismo, o socialismo ou algum hibrido aí concernente? Não pagam contas, tributos e taxas?
Não fazem compras no supermercado? Estão livres de pedágios e boletos? Por acaso, técnicos se teletransportam para a galáxia vizinha e retornam para este planetinha fraturado apenas para o trabalho em repartições ou autarquias?
Técnicos, portanto, são divindades acima do bem e do mal em suas pelejas eternas pelo domínio da vida, da matéria e da história humana? É do que se trata? Ora, ora... Francamente, isso não me parece ter o menor cabimento.
Dia desses um interlocutor bastante agressivo me acusou de ser 'de esquerda'. É que eu defendia em outros escritos que as pessoas deveriam ter seus direitos fundamentais como acesso a educação de qualidade, ao menos a três refeições diárias e de real valor nutritivo, direito a morar adequadamente, direito a serviços essenciais como saúde e segurança plenamente assegurados e, por isso e exatamente por isso, o incauto feroz de babar me etiquetou de ser 'esquerdista, comunista e petralha'. Caramba...
Mas a defesa da realização de direitos naturais como alimentar-se, decodificar leituras e tratar de ferimentos ou enfermidades em local especializado me faz ser de esquerda? O que uma coisa tem que ver com outra? Esses são imperativos civilizacionais; são determinações humano-históricas; são exigências, condições ou pré-requisitos estruturais e fundamentais para que se conforme um indivíduo, que se constitua um povo, um país, valores modernos e altruístas, uma sociabilidade superior, uma civilização e seus horizontes. É política? Sim... É a política original e a que todos deve contemplar! 'Que idiota!', pensei!
A negação da política, o desprezo pelas lutas sociais e que se aferram por modernizar o Estado é o estratagema meridional que mantem enérgico o viral do fascismo, devidamente acomodado nas urdiduras do tempo político. A negativa das instituições da política hodierna e que, por certo, carecem de justeza, aperfeiçoamento e melhorias, é movimento muito perigoso e que justifica na quadra histórica seguinte o surgimento de formas sutis ou abertas de autoritarismos e que, nada, nada, é política de fio a pavio, de ponta a ponta e de lado a lado.
Efetivamente, não é política com a substância e os conteúdos que democratas, reformadores sociais sérios e ativistas populares comprometidos defendem e que precisamente, é a política como expressão livre, consciente, consequente e advinda das massas, das bases sociais para o conjunto da formação social da qual se é parte de modo e maneira a refazer o país, suas instituições e sociabilidades correlatas a partir de valores comuns, coletivos e comunitários.
Os que cansaram desta peleja política; que não aguentam mais falar de tanta corrupção; que descreem das lutas do mundo do trabalho acabam por afiançar a força do arbítrio, do despotismo, a força de ditaduras. Aí sim... Aí toda essa 'bagunça' desaparece! Porque desaparecem partidos, sindicatos, associações, movimentos de rua, manifestações, greves, paralisações e manifestos.
Aí... Tudo funciona que é uma beleza; a engrenagem do Estado é ajustada, notadamente, com o sangue de milhares e milhares e as contradições quase não aparecem mais, embora, o sangue corra aos borbotões nos guetos, baixadas e favelas, ocupações,vivendas e aldeamentos.
Nos interessa a compreensão das contradições e sua superação; interessa que a população não negue a política, mas que a assuma compreendendo que ela é obesa de limites e fissuras, mas que, ainda assim, é algo importante porque é o resultado histórico de séculos de luta social. É nosso começo!
Por fim, me lembrei da máxima e bastante atual do poeta e dramaturgo alemão Bertholt Brecht (1898-1956), vítima de duas guerras mundiais e que nos ensina que 'a cadela do fascismo sempre está no cio!'. Pensemos: A que se deve a longevidade dessa infame fertilidade? Fácil... O encantado mundo da apolítica, da indiferença social, da apatia, ante aos desafios do povo, esse narcisismo que me toma. Esses, meus caros... São os férteis do fascismo!"
Ângelo Cavalcante - economista, professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG), Campus Itumbiara.

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