O Fantasma da desigualdade
"O Banco Mundial fez, no relatório de 2017, uma declaração num primeiro momento muito alvissareira: nas últimas décadas a pobreza no mundo diminuiu em cerca de um bilhão de pessoas, das quais 700 milhões são chineses. No entanto, um exame mais acurado da situação, revela que não se enfrentou o problema fundamental de um desenvolvimento equilibrado e inclusivo, que continua apenas uma esperança, apesar de o Fórum Econômico Mundial deste ano reconhecer que emerge um consenso mundial a respeito da necessidade de um tratamento mais socialmente inclusivo no crescimento econômico. A questão da desigualdade, contudo, continua praticamente intocada embora, como diz Dowbor, tenha atingido níveis obscenos: '...oito indivíduos são donos de mais riqueza do que a metade da população mundial, enquanto 800 milhões de pessoas passam fome'. A perspectiva é de aumento de desigualdade através da dominação dos intermediários financeiros sobre o processo produtivo, o que levou à introdução, nas últimas décadas, de novos mecanismos de ganhos especulativos e de geração de desigualdade. Comparando diferentes dados, diz Dowbor, chega-se a uma conclusão óbvia: destruímos o planeta para proveito de 1% da população mundial, portanto, desastre ao mesmo tempo ambiental e social. Daí porque nossas ações futuras devem orientar-se para inverter a destruição do planeta e o processo cumulativo de geração de desigualdade.
O Brasil é um espetáculo de desigualdade e se situa entre os dez países mais desiguais do mundo. O economista e especialista em políticas públicas, P. Kliass, lembra que toda nossa economia está configurada com o objetivo básico de promover a geração de recursos para o pagamento da dívida: em 2008-2009 cerca de 3% do PIB. Entre janeiro de 1997 e 2017, houve transferência para o pagamento dos juros da dívida de R$ 4,4 trilhões, afirma o relatório mensal do Tesouro Nacional. Mesmo os governos recentes, que conseguiram implementar um programa de redução de pobreza (entre 2003 e 2014, R$ 29 milhões saíram da condição de pobreza) e inserção social (o nível de renda dos 40% mais pobres subiu 7,1 %), promoveram transferência de renda para o grande capital e os grandes conglomerados empresariais, sobretudo para os estratos do topo da pirâmide, os super-ricos. O não enfrentamento, diz Kliass, desta descomunal transferência de riqueza é um dos maiores problemas crônicos da economia brasileira e certamente um dos pontos de continuidade mais danosos ao País dos governos FHC, Lula, Dilma e Temer em matéria de política econômica.
Encaminhar trilhões aos cofres do sistema financeiro dos super-ricos por duas décadas significou impossibilitar investimentos públicos e privados. Daí os efeitos negativos na indústria, na infraestrutura pública, nos serviços urbanos, na saúde, na educação, tendo como efeito a degradação da qualidade de vida das pessoas. O aumento da penúria se revela hoje com clareza na situação de mais de 13 milhões de trabalhadores sem emprego e no 1 milhão em ocupações informais. A brutal desigualdade de renda continua a ser o traço definidor do Brasil. A equipe econômica atual empenha-se no aprimoramento desta postura."
Manfredo Araújo de Oliveira, filósofo (UFC)
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