"O diretor sumiu", por
Marta Suplicy
Folha de São Paulo
Tenho pensado muito sobre a delicadeza e a importância da transparência
nos dias de hoje. Temos vivido crises de todos os tipos: crise econômica,
política, moral, ética, hídrica, energética e institucional. Todas elas foram
gestadas pela ausência de transparência, de confiança e de credibilidade.
Se tivesse havido transparência na condução da economia no governo
Dilma, dificilmente a presidente teria aprofundado os erros que nos trouxeram a
esta situação de descalabro. Não estaríamos agora tendo de viver o aumento
desmedido das tarifas, a volta do desemprego, a diminuição de direitos
trabalhistas, a inflação, o aumento consecutivo dos juros, a falta de
investimentos e o aumento de impostos, fazendo a vaca engasgar de tanto tossir.
Assim que a presidenta foi eleita, seu discurso de posse acompanhou o
otimismo e reiterou os compromissos da campanha eleitoral: "Nem que a vaca
tussa!".
Havia uma grande expectativa a respeito do perfil da equipe econômica
que a presidenta Dilma Rousseff escolheria. Sem nenhuma explicação, nomeia-se
um ministro da Fazenda que agradaria ao mercado e à oposição. O simpatizante do
PT não entende o porquê. Se tudo ia bem, era necessário alguém para implementar
ajustes e medidas tão duras e negadas na campanha? Nenhuma explicação.
Imagina-se que a presidenta apoie o ministro da
Fazenda e os demais integrantes da equipe econômica. É óbvio que ela sabe o
tamanho das maldades que estão sendo implementadas para consertar a situação
que, na realidade, não é nada rósea como foi apresentada na eleição. Mas não se
tem certeza. Ela logo desautoriza a primeira fala de um membro da equipe.
Depois silencia. A situação persiste sem clareza sobre o que pensa a
presidenta.
Iniciam-se medidas de um processo doloroso de
recuperação de um Brasil em crise. Até onde ela se propõe a ir? Até onde vai o
apoio à equipe econômica?
Para desestabilizar mais um pouco a situação, a
Fundação Perseu Abramo, do PT, critica as medidas anunciadas, o partido não
apoia as decisões do governo e alguns deputados petistas vociferam contra elas.
Parte da oposição, por receio de se identificar com a dureza das medidas, perde
o rumo criticando o que antes preconizou.
O PT vive situação complexa, pois embarcou no circo
de malabarismos econômicos, prometeu, durante a campanha, um futuro sem
agruras, omitiu-se na apresentação de um projeto de nação para o país, mas
agora está atarantado sob sérias denúncias de corrupção.
Nada foi explicado ao povo brasileiro, que já sente
e sofre as consequências e acompanha atônito um estado de total ausência de
transparência, absoluta incoerência entre a fala e o fazer, o que leva à falta
de credibilidade e confiança.
É o que o mercado tem vivido e, por isso, não investe.
O empresariado percebe a situação e começa a desempregar. O povo, que não é
bobo, desconfia e gasta menos para ver se entende para onde vai o Brasil e seu
futuro.
Acrescentem-se a esse quadro a falta de energia e
de água, o trânsito congestionado, os ônibus e metrôs entupidos, as ameaças de
desemprego na família, a queda do poder aquisitivo, a violência crescente, o
acesso à saúde longe de vista e as obrigações financeiras de começo de ano e o
palco está pronto.
A peça se desenrola com enredo atrapalhado e
incompreensível. O diretor sumiu.
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